quinta-feira, 6 de março de 2025

Amar, verbo em transição

Eu sou uma cuidadora, adoro cuidar de quem amo e quem não gosta de ser cuidado?

Eu quero aprender, cada vez mais a me deixar cuidar também.

Qual é a medida do cuidado? Quando o cuidado se torna um excesso e uma invasão a autonomia do outro? Quando o cuidado "desresponsabiliza"  e "desocupa" o outro, pois quem realiza assume para si tarefas e decisões que são do outro?

O cuidado é uma forma de comunicar ao outro como nos sentimos em relação à ele. Isto é ok.

Quando usamos do ato de cuidar querendo comunicar amor,, o amor é o significado e o cuidado é o significante, ele é o tangível.

Nesta sintaxe como ordenar as palavras, as ações e desejos?

Três perguntas são fundamentais: 

  • Como cada um se sente cuidado? 
  • Qual é a medida adequada do cuidar? 
  • Tem reciprocidade no cuidado?

Eu percebi que durante anos da minha vida eu fiz somente uma pergunta, só busquei  compreender o que faz o outro se sentir amado. Não refleti sobre qual é a medida adequada para cuidar, decidindo e assim desresponsabilizando o outro sobre a necessidade de se posicionar  e também não prestei a necessária atenção sobre a importância de se deixar cuidar, equilibrando a troca entre "dar e receber".

Eu me sinto amada sendo valorizada como importante na vida de quem amo. Quando a minha presença é reconhecida e quando recebo apoio realizando alguma tarefa. Nunca dei o devido valor em ser amada sendo cuidada, mas deveria e agora não quero mais deixar de prestar atenção nisto.

Existem tantas diferenças entre nós, somos diferentes na forma como amamos, em como nos sentimos amados, como entendemos "cuidado". As nossas referências sempre são únicas, pois trazemos da família, das relações anteriores, trazemos de experiências de amor, de vivências de dor, assim somos uma resultado deste complexo de inúmeras conexões.

A gente fala tanto sobre amor e por vezes acha que amar é uma emoção quase que sobrenatural, espontânea, que por ser sentida não é passível de ser aprendida. Se é possível "aprender" a amar, isto eu também não sei, mas sei que é possível e necessário aprender a comunicar o amor.

Precisamos fazer um processo de reflexão sobre como comunicamos o nosso amor. Podemos começar pensando: Como nossos país, ou nossos cuidadores, nos comunicaram o amor deles por nós? como eles comunicavam entre si? Quais foram minha primeiras referências de afeto? Nestas respostas não tem certo e errado, nelas vamos encontrar as nossas referências e a partir delas podemos reforçar o que queremos, transformar o que não desejamos e sobretudo nos aperfeiçoarmos. 

Nunca saberemos explicar totalmente como nos apaixonamos e porque amamos alguém, mas se queremos viver este sentimento na sua plenitude,  precisamos reconhecer que aprender a comunicar o amor é algo deve ser aprendido. 

Não podemos transferir para o outro a responsabilidade de "adivinhar" aquilo que queremos, nem podemos presumir que sabemos o que o outro quer, sem ele dizer.

 É preciso aprender a comunicar e neste ato se deve observar se o outro tem uma escuta ativa para nos ouvir, assim como devemos ter atenção para a nossa capacidade de escuta sobre o que o outro diz sobre ele.

Amar é se conectar com a dimensão do sentidos, por isto que é tão bem descrito pela arte e pela poesia. Os sentidos incluem a visão que nos conecta, o tato que arrepia, o odor que inebria, o paladar com suas ocitocinas e a audição que nos permite conhecer o objeto do nosso desejo, seus pensamentos, ideias e visões de mundo.

Viver o amor é se relacionar e se relacionar é comunicar.

Eu sinto que perdi amores por ruídos de comunicação e por não saber equilibrar o dar e receber.

O que faz a gente se sentir amado tem haver com a nossa história de vida, tem haver com a nossa infância, sobre o que a gente aprendeu que é o amor. Precisamos entender isto.

Os nossos códigos de amor são necessariamente diferentes e tá tudo bem. Só que o amor romântico hollywoodiano fez a gente acreditar que existe uma espécie de "amor de verdade", onde nele as pessoas se comunicam só pelo olhar, quase que de forma sensorial. 

Só que isto é empobrecedor dos nossos sentidos, além de ser irreal e nos impedindo de trazer o amor para a concretude do dia a dia,  onde ele é de fato vivido.

O relacionamento não preciso só de amor, ele precisa de todos os sentidos, e ser trazido para a dimensão concreta da troca e da comunicação. É dizer para o outro o que nos faz nos sentir amados e ouvir o que o outro espera, é demandar e atender demandas, é também colocar de forma amorosa seus limites e acolher os limites do outro, sem julgar:  "você pode ir comigo assistir este programa?"; "Eu não gosto muito, mas se para você é importante eu posso ir"; "Neste programa eu não vou, prefiro te encontrar depois"; "Hoje eu gostaria de ir sozinha ver minhas amigas"; "Hoje fui na terapia e visitei alguns lugares dentro de mim que preciso ficar sozinha para me organizar"; "Eu gosto de receber presentes, me sinto valorizada"; "Você prefere ir sozinha ver seus filhos hoje?"; "Você quase não comenta quando tenho sucesso em algo, pode comentar, eu me sinto amada quando você compartilhar comigo as minhas vitórias".. 

Eu pensei e não disse "eu adoraria fazer este curso com você", "eu acho este grupo de discussão incrível, posso participar também?", "o que te chama atenção neste autor?", "me empresta este livro quando você acabar de ler? Eu acho tão interessante este assunto. Eu não entendo muito sobre isto, mas gostaria de saber mais para conversarmos juntas"

De um lado esperaram eu ir ao encontro, de outro eu tive vergonha de me "oferecer" para participar.

Algumas relações acabam não porque faltou amor ou faltou desejo, faltou comunicar...

É importante que a gente pergunte sem julgar,  que o outro saiba responder sem impaciência, que nos pergunte com interesse nos que temos a dizer, enfim que ambos saibam se comunicar de forma amorosa, respeitosa e não julgadora.

As respostas nem sempre estão prontas, pode ser que elas precisam de tempo.

Quando amamos as vezes temos o sentido da urgência e com isto, achando que sabemos o outro quer, antes dele comunicar, a gente se adianta. 

A intenção é ótima, mas apesar se ser motivada pelo amor, é um pseudo amor, pois não respeita o tempo do outro em processar, para que ele encontre a resposta onde se sente mais acolhido e confortável.

Tempo é o intervalo entre dois momentos e precisamos aprender a respeitar os intervalos.

O intervalo pode ser um mergulho para a cura e para o autoconhecimento.

Eu mergulhei, mas não sei ainda se já saí, não sei se este texto é um fechamento deste processo, ou se só estou pegando um folego para mergulhar novamente, mas sinto que não sou mais a mesma Marcelle que começou.

O que eu sei é que estou disposta a não repetir o que já aprendi.

Menos dogmas, mais comunicação, menos ruídos e mais amor

Nenhum comentário:

Postar um comentário